Cheguei a casa e deixei que escurecesse finalmente. Os dias ficaram maiores, de repente, e nem o anúncio contínuo de que a hora iria mudar foi suficiente para que me habituasse à ideia. Nunca é, aliás. Deitei-me como se o peso que carregava nos ombros pudesse simplesmente passar para a almofada. O cansaço do regresso e da novidade, mas sobretudo o cansaço de tudo o que ficou igual. Fechei os olhos, enquanto a luz do dia teimava em passar pelas persianas tortas da janela, e criei a minha noite durante o dia. Não a noite dos contos de fadas, aquela que traz trevas. A noite dos crescidos, que significa paz, por fim.
Dormi sem ser hora de dormir.
E acordei sem dever acordar.
Escrevi sem ser hora de escrever, e entretanto perdi a noção das horas, que na minha cabeça ainda são duas, e duas são muitas.