Zanguei os deuses

Ainda não sei bem como falar disto. Acordei e senti-me a pessoa mais triste do mundo, não porque seja uma tragédia, mas porque não estava à espera. Meti na cabeça que acabava a tese e, contra todas as previsões, constipações, noites em claro e falta de disponibilidade mental, acabei-a. Eram onze da noite e só o índice me faltava. Foi mais ou menos quando recebi um e-mail do meu orientador, a dizer que lamentava, mas que a minha dissertação não poderia ser entregue. Que para ficar muito boa precisava apenas de mais um mês, sem qualquer correria e somente com algumas alterações. Tentei explicar-lhe que, contrariamente a sempre, já não estava preocupada se ficaria ou não muito boa, só a queria entregar. Nada feito. Haviam pequenas falhas que não demorariam a corrigir, mas sendo a entrega hoje, não haveria tempo. Posso garantir-vos que, em todos os cenários que criei na minha cabeça, este nunca foi um deles. Nunca previ que o texto, como estava, não fosse suficiente. É lógico que percebo que não é só o meu nome em jogo, mas também o de quem orienta. Isso não faz com que estivesse à espera da reviravolta. Talvez por isso ainda agora me custe acreditar que ao almoço não vou imprimir nada. Que depois de tudo, depois de ter dormido uma noite em todas as sete da semana que passou, não posso entregar. Tenho a possibilidade de a defender em janeiro, é certo. Não é tanto tempo depois (com esta entrega só poderia defendê-la em dezembro), mas é uma possibilidade que custa 600 euros. E quando penso em tudo o que de realmente útil seria possível fazer com 600 euros, pequenas melhorias não é, certamente, o que me ocorre.

Tentei encarar pelo lado positivo. Olhar para a frente e esquecer isto. Também me custa ter trabalhado tanto para uma nota média, quando poderá ser mais (embora, se me dessem a escolher, continuasse a optar pela entrega já). Convenci-me que tinha que ser assim, mestrado só faço um! E peguei no computador, de novo motivada. Preenchi uma proposta para hoje, para o trabalho. Estava inspirada - sabe-se lá porquê -, e aproveitei. Com ou sem nova entrega da tese, as noites de sufoco acabaram e 90% está feito, não iria mais torturar-me com isso. Acabei e achei por bem ir ver um filme - coisa que já não fazia há um tempo. Era tarde, mas mesmo assim agarrei no computador para o levar para o quarto. Liguei-o ao cabo e o cabo à tomada. À mesma tomada em que sábado tinha entornado verniz. O computador nem deu hipótese, nem iniciou a sessão. Desatou aos zumbidos e a dar erros. Queimou algo, diz o pai. Que poderá ser a motherboard ou o disco. A primeira atira-o, praticamente, para o cemitério dos computadores. O segundo, atira, tudo o que lá tinha dentro, para o cemitério dos computadores.

E é assim. Sem ainda ter descansado. Sem estar livre da tese. Sem ter o trabalho para hoje feito. Sem computador
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