À segunda-feira


Seria de pensar que depois das peripécias dos últimos tempos a minha vida estivesse mais tranquila. Não está. É como se de repente me tivesse lembrado de sentir todo o cansaço que tentei ignorar nos meses que passaram, todas as noites sem dormir, todas as noites mal dormidas, os pesadelos, a aflição, a ansiedade. Tudo. Não me custa levantar da cama mais do que normalmente (é sempre chato, sobretudo às segundas-feiras). Custa-me, todavia, assim para os horrores, pensar. Pensar com qualidade. Reflectir, concentrar-me, ter paciência. Porque me sinto esgotada, sempre com sono, sempre com dores de cabeça e sempre a ouvir aquela voz, bem no fundo do meu hemisfério esquerdo, que me lembra que isto ainda não acabou. Não é o fim do mundo, mas é um período menos bom no meu mundo. Os livros que eu quero ler, os cursos que quero começar, os projetos que tenho pendentes, as receitas que quero experimentar. Tudo isso, tudo isso numa outra realidade, suspensa, que eu não sei quando volta à terra, ou à qual ainda não me voltei a habituar. Na verdade, o esforço incansável cansou. E acabou. Agora tudo é mais tranquilo, mas eu estou demasiado cansada para desfrutar da tranquilidade. Para já, é certo. Só passou uma semana. Mas a mim pareceu-me um mês. A mim, este início de semana, pareceu o início de uma nova luta - embora só tenha acordado para vir trabalhar, como em todos os outros dias. E cheguei de manhã tão cansada, tão esgotada e tão absolutamente desesperada por tranquilidade, que à mínima falha explodi. Porque já não aguento, já não tenho paciência e já me autorizei a não ter de ter. 

Estou convencida, desde que me lembro de ser, que o verdadeiro artista é o que sofre. Não sei se o li algures, se o vi num filme, se o ouvi num café. Sei que o fixei, sem saber bem porquê. E lembro-me muito dessa ideia quase sempre, de uma forma completamente natural. Não que seja artista de qualquer espécie. Mas se é verdade que há dias menos bons, em que nos apetece mandar tudo e todos à fava, por coisas que habitualmente desculpamos, também o é, para mim, que nesses dias sou mais criativa do que em quaisquer outros. Modéstia à parte (ou nem tanto assim, que qualidade não é defeito), tenho um coração de ouro. A bem dizer, sou uma jóia de menina. E nas minhas teorias mais profundas, para quem acredita nessas coisas das retribuições universais (que ainda nem sei se é o meu caso), começo a pensar que esta é a forma do cosmos devolver o sorriso aos bons, nos momentos mais escuros. Algo do género és um torturado, mas em compensação pintas quadros como ninguém, quando te sentes assim. Não eu, que sou uma nódoa nas artes plásticas. Geralmente, dá-me para escrever, para preencher propostas ou para fazer um brilharete na cozinha. Também costuma dar-me para pensar em tudo o que ainda quero estudar e conhecer, e desato a fazer planos. Mas desta vez, desta última vez, deu-me para desenhar, juntar frases com pinta e definir exatamente como vou produzir uma mini coleção de t-shirts. Eu. Há coisas que, realmente, não se explicam.

No fim, continuo cansada, exausta, esgotada, sem paciência e a explodir com facilidade. Continuo sem saber bem como dar os próximos passos, mesmo enquanto os vou dando. Continuo sem tempo, embora o tenha recuperado. Continuo sem fazer particularmente nada do que queria, porque há uma sombra pendente. No fim, porém, aumentei a lista e dei-me ainda mais razões para perder o juízo. E não é que isso me fez mais feliz?
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