Dramas de uma recém-apaixonada*

                                                                         Zooey Deschanel 

Problema #1 - Os jantares de aniversário dos amigos

Diz ela que mesmo sabendo uma relação como um todo, tudo o que a define está na parte. Que são únicos e divisíveis, em personalidade e compromissos. Ainda, que não tem de gostar do mundo dele, nem arrastá-lo para o dela, onde quer rir, estar e falar como sempre fez. Isto, claro, num contexto de festa de aniversário/ jantar de convívio, que é como quem diz, quando surge o convite da praxe, no qual se acrescenta a vírgula da relação, com uma nuance ou outra à expressão: "é claro que também é para o/a X vir".

Pois que acha a protagonista, tal como tantas outras mulheres - quiçá homens - que não deveria ser convidada para os jantares do namorado, assim como nenhum dos seus contactos mais próximos deveria estender-lhe o convite. Toda uma lógica de educação a move a convívios de que não faz parte, e vice-versa, quando, para si, tudo seria mais fácil se fosse dada a cada cabeça apenas o que dela é de direito. E há muita razão por aqui, muita matemática e resultados esperados. 1 + 1 é sempre igual a 2. O problema é que não há dois "uns" iguais, e tentar somá-los será sempre conta de ilusão (ou de romance, dependendo da perspectiva). Ora, percebê-lo e interiorizá-lo já não é novidade. Pensar sobre isso é legítimo. Todavia, insistir no raciocínio, é coisa de quem ainda não se habituou a fazer parte.

Se eu acho que dois só podem ser dois, sempre e em qualquer momento? Não. O espaço, tal como o silêncio, são bens preciosos. Mas dois juntos respeitam-se e vêm-se como tal. É por isso que o convite do exterior, de quem gosta, conhece e tem dois dedos de testa, surge em dose dupla. Não para um jantar de amigas/os ou para um café mais rápido. Porém, para o convívio de grupo, para os ajuntamentos de gente que vem para comemorar ou lembrar algo, faz sentido. Não é coisa em dose intíma, é festejo de segunda família, daquela que se constitui com as pessoas que connosco não partilham laços de sangue. E se entre elas existe alguém que escolheram para ter ao seu lado, naquele momento particular da vida, então só poderá ser bem-vindo. E ainda que assim não seja, é bonito e de quem é bem-criado, estender o convite.

O contra-argumento volta, cheio de indignação e defesa de todos os aniversariantes que colocam "estranhos" à mesa de jantar, só porque passaram a ser apêndices dos amigos que querem ter por perto. Vem a lógica da felicidade de um dia especial, que só deve ser partilhada com quem se conhece. E a história é a mesma: o que une duas pessoas não tem necessariamente - ou quase nunca - que ser lógico; e, feliz ou infelizmente, todos os que nos rodeiam isso sentem e disso se apercebem. É por coisa assim que fica bem trazer para o nosso mundo o amigo da namorada, ou a namorada do amigo.  Não que dela/dele tenhamos invariavelmente a melhor opinião: por vezes podemos simplesmente querer intoxicá-los sem dar nas vistas; mas é assim que as relações, num universo civilizado e de compaixão se processam.

Toca a cada um decidir ou não ir. Como em tudo na vida, o bom-senso quer-se vivo e de boa saúde. Se nos sentimos mal, se não nos encaixamos ou se, muito basicamente, não estamos com vontade, então temos que ter voz para dizer que não. O que não acontece, nem pode acontecer, é o questionamento de terceiros sobre as opções malucas de serem bem-educados e chamarem para o convívio alguém com quem estamos.

Somos únicos e divisíveis numa relação, em personalidade e compromissos. E isso, isso é coisa que nos cabe gerir em conjunto para um melhor resultado individual.

 
* Esta rubrica é inspirada na vida real. Não na minha, que nestas coisas é mais pacata; mas em uma ou duas outras, cheias de deliciosas peripécias.
© POST-IT AMARELO 2014 | TODOS OS DIREIROS RESERVADOS

PARA MAIS INFORMAÇÕES:
♥ dopostit@gmail.com
♥ https://www.facebook.com/postit.amarelo
imagem-logo