Assim, sim


Há coisa de três anos, quando conheci a M., íamos ao ginásio que nem loucas. Bem, eu ia ao ginásio que nem louca, e arrastava-a. Foi mais ou menos na altura em que o Biggest Loser estreou na SIC Mulher. Apesar de termos andando nesta rotina por vários meses, e de eu já fazer parte da casa há mais ainda, são dos de verão de que me recordo. De sairmos do trabalho a correr para a piscina do clube, à espera de apanharmos ainda uma réstia de sol que, obviamente, já não vinha acompanhada de qualquer calor. Recordo-me, como se fosse hoje, de a ver equipar-se com umas calças largueironas e uma t-shirt que parecia querer dizer-nos ‘i don’t care’. E ficávamos, ali, nas máquinas, as duas. Eu a dizer para aumentarmos mais 5 minutos, a cada vez que atingíamos o tempo combinado, e ela a pedir-me para pararmos, que eu era maluca. Dizia que eu era a Jilian dela. E já que tinha a fama, ralhava-lhe – amigavelmente – para ter o proveito. Convenci-a a fazer uma desintoxicação alimentar comigo, durante uns dias, e ela lá foi na conversa. Ao jantar, e como os pais de ambas estavam fora, ficávamos pela casa uma da outra e comíamos os corn flakes que eu tinha ido buscar ao Celeiro, sem açúcar, sem sal e, basicamente, sem sabor. Não tive muita fome nesse verão. Olhando para trás, pergunto-me o que se passou com o meu estômago. Eu estava sempre com calor, sempre a beber água gelada, chá e com muita vontade de coisas frias. Ao almoço, comia um pepino, um tomate e pouco mais. À dentada, se fosse preciso. E bastava-me. Porque me sabiam bem saídos do frigorífico  não me obrigavam a preparar nada na noite anterior, eram práticos e gostava do sabor. Hoje, se comer um tomate e um pepino, sento-me depois, à espera do almoço. O nosso organismo é, definitivamente, um bicho de hábitos.

Na altura, a M. chegou a fazer comigo uma medição de IMC, numa daquelas maquinetas que nos dão alguns valores interessantes. Depois dos resultados, disse-mo ontem que ainda se recorda, ficou deprimida. Fomos as duas, mas os valores dela estavam acima dos meus, e muito ligeiramente acima do ideal. Eu não me lembrava, eu desvalorizei. Agora, tenho a certeza que a situação seria a inversa. Alguns meses depois de termos deixado de trabalhar juntas, reencontrei-a mais magra – não que alguma vez tivesse sido gorda. A cara era outra, com uma estrutura óssea mais traçada e uma confiança diferente. Retomámos o contacto, mais ou menos esporádico, e acabámos por nos voltar a aproximar. Durante todo esse tempo, fui acompanhando a sua evolução. Nos últimos meses, a M. – que só ia ao ginásio obrigada e ainda não lhe tinha descoberto o mesmo prazer que eu lhe atribuía – voltou a inscrever-se num. Confesso que achei que não fosse durar muito. Não poderia estar mais enganada. Vai todos os dias. Fica várias horas. Faz aquilo que a diverte – as aulas, e corre sempre que pode, sempre tentando superar a última marca (aposto). Foi de férias, mas manteve o ritmo. Longe das máquinas e da rotina, sai da praia ao fim do dia, pronta para 5 quilómetros de corrida. Vai gira e tem mais atenção à roupa que usa. Esta não é a M. que eu conheci na sua relação com o desporto. É uma M. melhorada que, não se sentindo completamente satisfeita consigo – alguma vez nos sentimos? – decidiu mudar aquilo que podia controlar. E podia controlar o sedentarismo em que tinha caído. Todos podemos. A M. come o que lhe apetece,e é de apetites doces, mas compensa num esforço que se tornou prazer, como eu sempre lhe disse que se tornaria. Nos entretantos, eu enveredei pela via oposta: mal pus os pés no ginásio nos últimos – gostava de dizer meses – anos. Por várias razões, porque a vida aconteceu. E já tentei voltar. Já me inscrevi. Já acordei cedo alguns dias e saí de sorriso na cara, porque aquela descarga de adrenalina me sabia bem e me deixava mais tranquila em relação a tudo o resto. Mas depois há o trabalho. E o trabalho que há. E o cansaço e as desculpas que, não o sendo, não vão deixar de existir a não ser que realmente queiramos.

A M. é uma inspiração para mim. E às vezes é preciso cruzar-mo-nos com estas pessoas que nos inspiram e parar para valorizar isso, para acordarmos inspirados e nos lembrarmos do que realmente importa. Não um ginásio ou uma corrida, mas nós e o que podemos controlar e mudar na nossa vida.
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