Jennifer Aniston
Problema #2 - A anulação da personalidade
Quase sempre pela hora de almoço, conta-me ela que a vida ainda não vai certa, que a relação teria tudo para resultar, mas que, por algum motivo, não dá. Ora é ele que não a deixa pôr um ponto final, ora é ela que se perde entre o gostar, o não gostar e o não querer voltar a ficar sozinha. Diz que não sabe o que lhe aconteceu, e balança dividida entre a vida de hoje e a vida que tinha, que não era, contudo, satisfatória na altura. Houve sempre uma parte em falta, e ela achou ter encontrado essa parte; talvez por isso se tenha deixado anular em função de um desejo antigo.
Não é de hoje a conversa dos amigos que se perdem em relações, daqueles que conhecemos, que deixam de ser quem são para, de repente, viverem um para o outro. "Hão-de ficar sozinhos quando acabarem, afastaram tudo e todos à volta". E quanto mais assim se pensa, mais assim se ouve pensar, mais desejamos que assim não seja. É preciso sermos sempre dois, mesmo enquanto um. Qualquer outra conta, deixa de ter volta a dar. Por muito que se goste, por muito que haja cumplicidade, carinho e conforto: se nos habituámos a ser as pessoas que outrora criticámos, se não nos reconhecemos na nossa rotina e se, acima de tudo, estamos muito conscientes desse facto, então não vai resultar.
Ninguém permanece igual e indiferente. Não somos imutáveis, e criar laços será sempre a antítese dessa ideia, quanto mais não seja porque nos disponibilizamos a fazê-lo, abdicando de outras partes de nós, de que nem sequer sentimos falta. O problema é quando damos conta, como ela; é quando estamos perfeitamente cientes que abdicámos demasiado.
* Esta rubrica é inspirada na vida real. Não na minha, que nestas coisas é mais pacata; mas em uma ou duas outras, cheias de deliciosas peripécias.