Eu tenho um Herbie na garagem e 1000 ideias na cabeça


Tenho a mania de andar mais depressa quando estou cansada: é a fórmula mais eficaz para acabar com o sofrimento. Não faz sentido que, no meu mundo, me arraste do ponto A para o ponto B porque me doem os membros todos: vou levar uma eternidade a fazê-lo, e o tormento só será amplificado. Talvez por isso me tenha saído tão bem nos corta-matos e afins de uma vida passada. Nunca fui a mais rápida, nem sequer aquela com mais resistência, mas sempre fui a mais persistente. Sempre consegui dar mais do que achava ser capaz na recta final, e foi assim que fui coleccionando medalhas.

Costumo irritar as pessoas à volta quando acelero o passo. Tenho por hábito quase correr no centro comercial se por lá estiver um sem número de horas, tal como aumentar a velocidade nas máquinas do ginásio, mesmo nos últimos minutos. É claro que, neste caso, de nada me serve: não vou chegar mais rápido a lado nenhum. Todavia, é defeito de fabrico e pau que nasce torto tarde ou nunca se endireita. O problema é se continua a entortar. Aí, bem aí a coisa pode chegar à necessidade de terapia por choques eléctricos.

Pois que ultimamente tenho notado uma certa tendência para transferir esta mesma teoria para a condução. Quanto mais tarde chego a casa, quanto mais cansada estou, mais rápido quero ir do trabalho para a cama. Como não tenho por hábito correr de casa para o trabalho, nem do trabalho para a faculdade e muito menos da faculdade para casa novamente, eis que me resta o carro. Já me tinham dado o toque há uns dias. Mas eu achei que não, não andava nada a carregar no acelerador. Nem sombra de dúvidas. Pois que andava, e que ando, e que a gasolina se vai mais rapidamente. Qual Colin Mcrae, qual quê. Haviam de experimentar fazer rotundas comigo nas últimas semanas. Eu sei, eu sei: as estradas são perigosas, o excesso de velocidade é punível por lei, ninguém está livre de uma desgraça, não somos super-heróis. Eu sei. Não sou irresponsável. Faço-me valer de um eixo norte-sul totalmente livre, às onze horas da noite; e sabe-me francamente bem. Mas é preciso ver que no meu carro, no meu querido e amável carro que nos últimos tempos perdeu o espelho retrovisor porque eu lhe dei uma cabeçada e se partiu, atinge os 120 com a euforia de um Carrera que anda a 200. É preciso lembrar que mais do que isso faz qualquer um sentir que está no epicentro de um terramoto, de tanto que o carro treme. É fundamental ter estas coisas em mente. Tanto quanto a sua gracinha de perder os travões sem aviso ou lembrete. Nem um post-it. E é por estas e por outras que a coisa não se torna grave. É uma discussão entre o vamos-rápido-para-chegar-rápido e o vamos-devagar-antes-que-fiquemos-aqui-para-sempre quase, quase infinita. O último costuma ganhar.

Porém, ontem* vinguei-me. Ontem o carro era o do pai. E foi ontem que me apercebi que talvez ande com alguma inclinação para um pé pesado. E fiquei a pensar nesta transferência de comportamentos quando as ferramentas disponíveis são outras, e no quão diferente se pode tornar a mesma situação só por causa disso. Diferentes meios exigem diferentes responsabilidades, comportamentos e posturas. Já está na altura de se aprender algo como isso.

PS. Família, este post é interdito ao pai. É favor não avisar.

PS 2. Olá pai, se estás a ver isto porque alguém não leu o PS, ou leu e fez questão de ignorar, quero que saibas que é tudo um exercício de criatividade proposto nas aulas. Sou só eu a ser aplicada.


*Este post deveria ter sido publicado dia 1 de Outubro. O 'ontem' refere-se, por isso, a 30 de Setembro. Devido a falhas técnicas e esquecimentos crónicos não foi possível passar o estado do texto a 'publicado' até ao momento.
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